Porcolitro

Porcolitro era um leite muito safadinho, derramava sempre. Os outros litros falavam para ele: cuidado, você vai acabar sujando tudo. Mas o litro não estava nem aí, todo dia fazendo a mesma coisa. Até que um dia veio uma fada e transformou o litro em porco, num porcolitro, que protagonizou mil aventuras...



Créditos das aventuras de Porcolitro: Milton Nascimento e Maria Dolores Duarte.
As aventuras a seguir são por minha conta.

domingo, 20 de abril de 2014

Mulher temporã

Sou de um tempo
em que os vizinhos se cumprimentavam
e quando algo quebrava
consertávamos
havia em cada bairro um bom sapateiro
e uma super bonder
em toda geladeira

Sou de um tempo
que a mulher nascia e vivia
para ser mãe
e amar seu marido
e se dedicar à família
o bem mais precioso

Sou de um tempo
que a mulher não trabalhava
e que deveria se cuidar
ter seios fartos para amamentar
quadril largo para gerar
deveria também ter mãos macias
e coração acolhedor

Por isso hoje, pela manhã
enquanto a água do café fervia
colei a sola do meu velho sapato
companheiro de marcha

Saí à rua e lá estavam meus vizinhos
dormiam em papelões nas calçadas
eram crianças, mulheres e homens
sem mãe e sem família
quis consertar
fiz de todos, meus filhos

Eu, mulher temporã
com meus seios secos
meu útero seco
minhas mãos calejadas
e meu coração
vadio
trabalhei por mim
e por eles e por todos
o mundo, o bem mais valioso
e meu tempo, hoje.

2 comentários:

  1. Eu, de seios tão fartos, ventre fértil e quadril largo, não me lembro da última vez que a aspereza das minhas mãos me deixou acolher.

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  2. Belíssimo Má. Fui ver o significado de "temporã" agora. Uma poesia militante. A última estrofe é uma bonita surpresa e dá todo outro sentido ao resto. Você não está fora do tempo, faz seu tempo.

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